A decisão de nos distanciar da religião que cega,
oprime e conduz o Homem à ignorância deve prevalecer nos homens em que a
razão é desenvolvida. O que não podemos jamais esquecer é que o
sentimento de "religiosidade" não deve se afastar da prática na vida do
homem, pois se isso acontecer, ele perde a noção de quem é, do que está
fazendo aqui e todos os seus valores desaparecem com seus atos, torna-o
“des-Humano".
A prática da Religiosidade e da Religião são
coisas absolutamente distintas e não devem ser confundidas de forma
alguma. A primeira independe da segunda, e a segunda lamentavelmente
pode também ser encontrada divorciada da primeira. Religião é sempre
instituição, acordo social, edifício teórico, organização hierárquica,
atividade política. Religiosidade é o sentimento maior (inato), a fé
praticada, a posição mais íntima, a intuição do mistério.
Herculano
Pires esclarece que esse sentimento se estrutura na consciência humana
no ser em evolução, sendo que a marca de Deus ali está presente na Lei
de Adoração, que é o sentimento inato de sua filiação Divina e se
manifestará no sentimento religioso, base de todas as experiências
religiosas da Humanidade.
Ele diz ainda: “A vivência religiosa, pelo
simples fato de ser vivência e não reflexão é inerente ao Homem desde o
seu aparecimento no Planeta”. A experiência de Deus que começa no “Fiat”
como elemento ontogenético (elemento constitutivo da própria gênese do
homem) difere da religiosa, que constituem uma tomada de tentativa de
consciência de Deus através de formulações religiosas, rituais,
Instituições, sistemas litúrgicos, ordenações dogmáticas.
Reforça
ainda, conceitos sobre a Trindade Universal, espírito e matéria
elementos constitutivos do Universo e Deus o poder criador, onisciente,
controlador e mantenedor, e Suas Leis que regem o equilíbrio universal.
Em seu livro “O espírito e o Tempo” com base no
esquema chamado “método cultural” dos antropólogos ingleses, aplicado
por John Murphy, com pleno êxito em seus estudos sobre as origens e a
história das religiões, Herculano nos deixa um verdadeiro tratado de
antropologia espírita. Faz uma viagem pelos “horizontes” percorridos
pelas Civilizações desde as eras remotas, retratando com clareza o
processo de conscientização do ser em evolução e de sua essência Divina,
demonstrando que não estamos sozinhos nesse processo cíclico e
Universal.
Herculano com essa obra magnífica, permite entre tantos
outros conhecimentos, compreender em profundidade a questão 628 do livro
dos Espíritos, que não podemos negligenciar nenhuma religião, pois ela
pode contribuir muito com a nossa instrução, se estudarmos o que há de
bom nelas, conhecendo o poder de influência que teve em nossos caminhos
evolutivos e que persistem até os dias de hoje.
Os cientistas da Religião dizem que no Brasil, o
fenômeno de sincretismo religioso em comunhão com três culturas
fortemente calcadas na mística fez com que os elementos formais de cada
uma das três culturas fundissem em uma interpretação comum do sagrado.
Assim como o africano, o indígena possui uma visão bastante
espiritualista do mundo.
Ambos enxergam-se imersos num universo
vivo, dinâmico de forças espirituais e elementais, diante das quais os
ritos e a fé são imprescindíveis mecanismos de ação concreta do homem no
mundo. Por conta disso a religiosidade que se desenvolveu aqui é por
assim dizer, imune à depreciação do sagrado que o ceticismo enseja. Mais
do que em qualquer outro lugar, a palavra de Herculano Pires é válida: O
ateísmo é flor de estufa, incapaz de viver fora do laboratório e dos
círculos mais alienados da vida natural.
Embora a religiosidade do brasileiro respeite os
dogmas e o arcabouço teórico das instituições religiosas este respeito
é, por assim dizer, um respeito de conveniência.
Assim que o
sacerdote de uma igreja se mostrar ineficiente no consolo espiritual ou
nas funções efetivamente místicas de seu rebanho ele será substituído
pela benzedeira, pelo pastor, pelo médium ou pela mãe de santo. Se algum
destes novos orientadores espirituais mostrarem-se mais eficaz no trato
com os arcanos o padre será substituído, ou algo ainda mais estranho,
será relegado a uma posição social enquanto a importância espiritual
será transferida para o novo intermediário. O indivíduo irá à missa, mas
não depositará suas esperanças maiores nela. No momento crucial
recorrerá ao novo “representante” das forças celestes.
A grande maioria exerce a sua religiosidade com
muito mais força do que a imposição religiosa em si. Basta ver as
estatísticas de “fuga dos adeptos das religiões” que cresce dia a dia.
As pessoas estão em busca de respostas e de soluções para seus diversos
problemas, e se não encontram na religião escolhida, buscam outra que os
satisfaça. E olha que tem grupos muito bem preparados para estudar os
“desejos mais profundos de seus adeptos” e muitos criaram vários
“serviços” para satisfazê-los e não perdê-los para outras denominações
religiosas.
Se o espiritismo vem de encontro às respostas de tantas
aflições humanas porque será que nosso “público alvo” (como
denominamos), anda diminuindo tanto?
Apesar de a mídia ter feito por nós uma
propaganda em massa nos últimos anos, a favor dos conceitos espíritas e
espiritualistas, por vezes até equivocados, o número de pessoas que
buscam esse conhecimento não cresce tanto quanto o número de evangélicos
e de igrejas pentecostais. Pior! O movimento espírita tem relatado que
diminuiu o número de voluntários e trabalhadores nas Casas espíritas,
que não conseguem manter as portas abertas todos os dias em todos os
horários da semana com atendimentos diversos. No momento não estão
preocupado em identificar quais são as reais necessidades daqueles que
batem à sua porta e acabam oferecendo um atendimento padrão (salvo
algumas exceções em diversos Estados e até em alguns países), alguns
acabam fazendo um verdadeiro dês-serviço à Doutrina espírita.
Entre os seus adeptos e freqüentadores existem
diversos problemas de relacionamento, como em todos os lugares,
principalmente nas grandes Instituições representativas do movimento,
com isso surgiu a necessidade de sermos “afetivos”, nasceu o termo”
alteridade”. Cresce o convite para viver o Evangelho tão bem "pregado" e
tão pouco "sentido", é o momento de aliar o conhecimento a
prática.Talvez isso aconteça por que os excessos de religiosismo estão
sufocando o sentimento natural e espontâneo da religiosidade devido a um
grande números de almas ligadas à religião dogmática, estarem
reencarnados no Brasil e com tarefas importantes no movimento espírita
Brasileiro, segundo informações dos espíritos.
Que desafio!
Com certeza precisamos atentar
para essas questões que tem levado o Espiritismo no Brasil a seguir
caminhos “religiosos” demais fugindo da proposta de religar o Homem a
Deus em seu sentido verdadeiro, e não criarmos mais uma religião que
pode perder-se “na letra que mata distante do espírito que vivifica”,
como fez o Protestantismo, uma esperança de renovação para a época em
que ele surgiu.
No livro “Agonia das Religiões” Herculano diz que
o místico vulgar não mergulha em si mesmo para encontrar em Deus a
relação com o mundo como fez Descartes, mas pelo contrário, desliga-se
do mundo e liga-se isoladamente a Deus. Não é guiado pelo amor à
Humanidade, mas pelo amor a si mesmo. A busca solitária de Deus torna-se
um ato egocêntrico. Que a concepção espírita vai mais longe e mais
fundo, negando ao homem o direito de isolar-se do mundo para buscar
Deus. O meio natural de evolução para o homem, para todos os seres é a
relação... (Lei de Sociedade).
“... enquanto Buda abandona o mundo para buscar Deus na solidão, Cristo mergulha no mundo para religar os homens à Deus.”
Daí o fato de a migração entre Religiões ser tão
comumente aceita no Brasil, enquanto a fidelidade à instituição é sempre
primordial na Europa, no Islã, na Ásia oriental. O Brasil está
imunizado a guerras religiosas justamente pelo fato de que a religião
aqui é algo pouco valorizada, pouco significativa, em face da
religiosidade mais universal e mais profunda que se manifesta nesta
população.Herculano afirma ainda, que a etiologia da decadência das
religiões torna-se palpável, mas o sentimento religioso do Homem não foi
aniquilado.
Hoje muitos dizem que o caminho é a Educação,mas
devemos lembrar também que a Educação “leiga” do ensino Laico, frustrou
a possibilidade de reelaboração da experiência religiosa pelas novas
gerações e determinou a sedimentação interesseira da sua posição de
ambivalência no mundo contemporâneo. Como não podia deixar de acontecer,
essa posição ambígua, indefinida e contraditória em si mesma, levou a
proporções catastróficas a crise das religiões em nossos dias. (palavras
de Herculano no livro: Agonia das Religiões- pg. 17).
Kardec bem sabia disso e aborda o tema Educação
por diversas vezes em suas obras, colocando-a como fundamental.
Encontramos uma Biografia de Kardec, escrita por Zeus Wantuil, no volume
II, que mostra claramente o trabalho árduo que Rivail enfrentou em seus
30 anos dedicados à Educação, para romper com a interferência religiosa
no campo do conhecimento, os homens se afastaram do sentimento de
religiosidade, formando a sociedade sem moral que temos hoje.
Nos trabalhos realizados por Jean Jaques Rousseau
" em Emílio" um ensaio pedagógico em forma de romance, vemos a
preocupação de tirar o peso da religião Dogmática da Educação, mas sem
deixar de trabalhar o sentimento de religiosidade (essência espiritual)
da natureza Humana, e viver a Educação Natural, fundamental ao processo
de educação e desenvolvimento de valores Humanos. Pestalozzi bebeu desse
conhecimento e Rivail também. Precisamos rever nossos conceitos de
educação urgente. Seria muito bom se os educadores de hoje tivessem
acesso não somente à pedagogia e a didática dos grandes educadores, mas à
essência dos seus estudos que levariam fatalmente ao amadurecimento da
consciência humana para encaminhar o Homem às conseqüências do
conhecimento espiritual, a sua efetiva transformação moral!
Damos o início a uma nova Civilização, a
Civilização do 3º Milênio ou a Civilização do Espírito. É o período onde
a teoria e a prática estará integrada, o anseio latente de
transcendência será preenchido. Herculano diz que é necessário que ele
viva em si todo o conhecimento, na consciência e na carne, pois é nessa
(na carne) que a relação com o mundo se realiza. Na questão 625 LE, os
espíritos deixam um modelo a ser seguido, Seus atos falam por Sí, ele é
Jesus.
As Civilizações experimentaram períodos de
Sombras e de Luz, e os seres que nela habitaram após percorrerem esse
longo caminho, fatalmente encontrarão a “síntese do conhecimento, o
caminho para o novo Céu e a nova Terra, lembrando do que disse Jesus:”
Os mansos e Pacíficos, herdarão à Terra”, então ela não desaparecerá
como acreditam alguns mais assustados diante de tantas versões
escatológicas do final dos tempos. Chegará sim o fim da Ignorância para
toda a Humanidade e a Era do Espírito virá com a força da Lei do
Progresso e nos resta curvar-se à ela.
“Dia virá, em que todos os pequenos sistemas,
acanhados e envelhecidos, fundir-se-ão numa vasta síntese, abrangendo
todos os reinos da idéia. Ciências, Filosofias, Religiões, divididas
hoje, reunir-se-ão na luz e será então a vida, o esplendor do espírito, o
reinado do Conhecimento. Nesse acordo magnífico, as Ciências fornecerão
a precisão e o método na ordem dos fatos; às Filosofias, o rigor das
suas deduções lógicas; a Poesia, a irradiação das suas luzes e a magia
das suas cores; a Religião juntar-lhes-á as qualidades do sentimento e a
noção da estética elevada. Assim, realizar-se-á a beleza da força e na
unidade do pensamento.
A alma orientar-se-á para os mais altos
cimos,mantendo ao mesmo tempo o equilíbrio da relação necessário para
regular a marcha paralela e ritmada da inteligência e da consciência na
sua ascensão para a conquista do Bem e da Verdade.” – ( “O problema do
Ser, do Destino e da Dor” - Leon Denis).
Que esse período seja muito bem vindo!
Depende
de nós contribuir verdadeiramente com a sua chegada. E a lição máxima
deixada há mais de 2.000 anos ainda é o caminho para esse período:
“Amai a Deus sobre todas as coisas e ao Próximo como a Sí mesmo”.
Referências Bibliográficas
(1) KARDEC, Allan -“O Livro dos Espíritos”.
(2) PIRES, Herculano -“O Espírito e o Tempo”.
(3) PIRES, Herculano- “Agonia das Religiões”.
(4) DENIS, Leon - “O problema do Ser, do Destino e da Dor”.
(5) WANTUIL, Zeus – “Biografia de Allan Kardec” (vol.II).
Magali Bischoff (São Paulo/SP)
Magali
Bischoff, nascida na cidade de Guarulhos e residente em São Paulo,
colabora no Movimento Espírita desde 1992 . Atuou como voluntária na
Biblioteca Espírita Humberto de Campos, na Área de Divulgação e no setor
administrativo da Área Federativa, trabalho realizado junto as Casas
Espíritas coligadas à Federação Espírita do Estado de São Paulo (FEESP).
Participou dos projetos de divulgação da FEAL, levando ao movimento
espírita, todos os trabalhos realizados pela Fundação Espírita André
Luiz. A Rede Boa Nova de Rádio, TV Mundo Maior, Editora e Distribuidora
Mundo Maior, o site da Fundação e o Clube Amigos da Boa Nova, dessa
forma, divulgando a mensagem espírita. Atualmente realiza palestras em
Casas Espíritas, colabora no Curso de Aprendizes do Evangelho da
Federação Espírita do Estado de São Paulo, escreve artigos para jornais,
revistas e sites espíritas, participa também, de diversas listas
espíritas do Brasil como divulgadora.
E-mail magalibischoff@gmail.com
Blog http://cuidedoseumundo.blogspot.com